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terça-feira, 7 de maio de 2019

A ideia de começar um blog em 2019

Não era pra ser tão difícil.

Escrevo na internet há mais de 10 anos e em algum momento começaram a me levar a sério. Não sou especial nem nada, mas é que hoje em dia todo mundo leva tudo muito a sério, as pessoas se levam a sério demais. Escrever na internet me deu alguma ideia do que fazer da vida, um projeto pessoal que amo, alguns empregos, muitos amigos, rolos e romances, madrugadas insones e um tema de pesquisa que é a minha vida agora, mas escrever na internet às vezes me deixa com vontade de nunca mais escrever ou existir na internet. Eu tenho me levado muito a sério.


Quando comecei meu primeiro blog a ideia era falar sobre coisas que eu gostava muito, mas meus amigos não ligavam. Hoje em dia tenho a chance de escrever sobre os artistas que mais gosto e passar horas falando sobre o final de Mad Men sabendo que existem pessoas interessadas em ouvir, e isso é muito legal, mas ando cansada de transformar tudo que consumo em Conteúdo, fazendo da minha vida uma commodity na forma de Experiência que vai virar dinheiro na mão de grandes empresas, e que só vai me render uma crise de ansiedade quando alguém resolver usar o que escrevi pra dizer que sou uma pessoa ruim.

Talvez começar um blog seja só um jeito despretensiosamente pretensioso ou insuportavelmente ingênuo de seguir essa mesma lógica, mas é algo que quero tentar. Eu ainda trabalho com marketing digital, tiro 30 fotos iguais da minha cara até achar uma boa, estou lendo uma lista de referências que inspiraram o último disco do Vampire Weekend, compro água tônica orgânica rosé e queria uma mochila Kanken igual todo mundo, mas essa não é a minha vida inteira e não é isso que quero compartilhar. Não é uma resistência ou manifesto de coisa alguma, é só uma coisa que inventei pra perder tempo na internet.


Esse blog é inspirado no meu tio que todos os dias descreve minuciosamente o que comeu no almoço, nos áudios gigantes que a Clara me manda com digressões inúteis sobre o caminho que fez até a faculdade, e em todas as pessoas que têm uma linha de ônibus do coração e sabem dizer o por quê. E também, é claro, no blog Minhas Refeição, que é provavelmente a minha coisa favorita em toda a internet. Minha ideia é falar sobre linhas de ônibus favoritas, fazer reviews de estações de metrô, listar os melhores estabelecimentos bar & lanches da cidade de São Paulo, compartilhar artes feias e trechos de música sem contexto. O nome, ideia da Clara, é uma homenagem a todas as pessoas que deixam suas opiniões no Trip Advisor e sites afins - vocês não fazem ideia da quantidade de maluco que tem lá.

Encerro esse texto de abertura com um trecho do "Poema em linha reta", do Álvaro de Campos, que diz de um jeito bonito tudo que sinto quando alguém me pede uma lista das lojas e brechós mais legais da cidade, um sentimento equivalente às personagens de Romy and Michele's High School Reunion pedindo um "business woman special" na lanchonete sem saber o que estão fazendo e o que aquilo significa.



"Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das
etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo."

(Sempre acho que esse poema é do Drummond)